Quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Suspensa ação penal por ausência de comprovação de transnacionalidade do crime de tráfico

Liminar deferida no Habeas Corpus (HC) 140311, pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski, suspendeu o curso de ação penal na qual  J.M.O. foi condenado pela prática dos crimes de tráfico de drogas e associação para o tráfico. O relator considerou plausível a alegação da defesa no sentido de que a Justiça Federal não teria competência para julgar o caso, uma vez que a transnacionalidade dos delitos não teria sido devidamente comprovada nos autos.

Para o ministro Lewandowski, estão presentes os requisitos que autorizam a concessão da liminar: a plausibilidade jurídica do pedido e o perigo da demora da decisão, uma vez que o réu teria sido sentenciado por juízo incompetente para a causa.

O caso

O juízo da Comarca de Itaberaí (GO) autorizou diversas medidas cautelares no curso das investigações, dentre as quais interceptações telefônicas, e assim se tornou prevento para julgar o caso. De acordo com as investigações, as drogas apreendidas eram oriundas do Estado do Mato Grosso e posteriormente eram distribuídas para o Estado de Goiás e para o Distrito Federal. No entanto, posteriormente, aquele juízo reconheceu sua incompetência para o feito e determinou a remessa dos autos à Justiça Federal.

J.M.O. foi condenado pela Justiça Federal à pena de 42 anos de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente fechado e sem o direito de recorrer em liberdade. Após o Superior Tribunal de Justiça (STJ) desprover recurso ordinário em habeas corpus, a defesa impetrou o HC 140311 no Supremo, sustentando que a condenação foi prolatada por juízo incompetente, pois o magistrado que proferiu a sentença teria “afastado a incidência da causa de aumento relativa à internacionalidade do delito”. Assim, alega incompetência da Justiça Federal para processar o feito, uma vez que a transnacionalidade não teria sido devidamente comprovada nos autos, devendo o processo ser remetido à Justiça estadual.

Decisão

Com base no artigo 70 da Lei 11.343/2006 (Lei de Drogas), o ministro Ricardo Lewandowski ressaltou que a competência da Justiça Federal só é atraída caso caracterizada a transnacionalidade do crime. “Assim, se o tráfico for intra ou interestadual, a competência será da Justiça dos estados”, ressaltou.

Ao examinar a sentença, o ministro considerou que a transnacionalidade do delito foi caracterizada de forma genérica, tendo em conta o tipo e a quantidade da droga, o que, para o relator, não parece ser possível. Conforme a lógica adotada na condenação, explicou Lewandowski, todo tráfico de cocaína seria transnacional, assim como todo aquele realizado em região de fronteira. O relator afirmou, ainda, que a contradição da sentença também se explicitaria na análise da dosimetria da pena.

Ao citar o artigo 40 da Lei da Drogas, o ministro ressaltou que a pena pode ser aumentada se caracterizada a transnacionalidade ou até mesmo a interestadualidade do delito. “Ora, se o crime é processado na Justiça Federal, tem-se que atendeu ao artigo 70 da legislação citada, ou seja, ficou ‘caracterizado ilícito transnacional. Então, é de se esperar que o magistrado aplique a causa de aumento correspondente”, disse. No entanto, o relator observou que, no caso dos autos, o juízo que proferiu a sentença aplicou a causa de aumento relativa ao tráfico interestadual, “o que evidenciaria a contradição da sentença em relação à fixação da competência”.

Em sua decisão, o ministro salientou que o deslocamento da competência não inibe o combate ao tráfico de entorpecentes. A pena para o tráfico interestadual é igual àquela cominada ao tráfico transnacional. “Contudo, as regras de divisão de competência entre a Justiça dos estados e a Federal são absolutas, não podendo, por isso, sofrer prorrogação”, concluiu.

Além da ação penal em que já há condenação – em grau de apelação – a liminar suspende o curso de mais duas ações penais que tramitam contra J.M.O na Justiça Federal, bem como de eventuais mandados de prisão expedidos em desfavor dele em relação a esses processos.

EC/CR

Link: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=336939&tip=UN