Questionada norma de Londrina (PR) que proíbe conteúdos com questões de gênero no ambiente escolar
O presidente do STF, ministro Dias Toffoli, verificou que o caso não se enquadra na previsão do Regimento Interno que autoriza a atuação da Presidência para decidir questões urgentes nos períodos de recesso ou de férias.
A Confederação Nacional dos Trabalhadores em
Educação (CNTE) e a Associação Nacional de Juristas pelos Direitos
Humanos de Lésbicas, Gays, Bissessuais, Travestis, Transsexuais,
Transgêneros e Intersexuais (Anajudh LGBTI) questionam, no Supremo
Tribunal Federal (STF), norma do Município de Londrina (PR) que proíbe a
adoção de conteúdos relacionados às questões de gênero nas rede
municipal de ensino. O questionamento foi apresentado à Corte por meio
da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 600.
O dispositivo questionado é o artigo 165-A da Lei Orgânica municipal,
inserido pela Emenda 55/2018, que veda “a adoção, divulgação, realização
ou organização de políticas de ensino, currículo escolar, disciplina
obrigatória, complementar ou facultativa, ou ainda atividades culturais
que tendam a aplicar a ideologia de gênero e/ou o conceito de gênero
estipulado pelos Princípios de Yogyakarta*”. As entidades apontam,
inicialmente, da invasão da competência privativa da União para
estabelecer diretrizes e bases da educação (artigo 22), e lembram que
essa competência foi exercida na edição da Lei federal 9.394/1996 (Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional).
Outros aspectos ressaltados são a laicidade do Estado, a “total
inconsistência do termo ‘ideologia de gênero’” e o potencial ofensivo da
medida, uma vez que, conforme estudos mencionados, o Brasil ocupa o
primeiro lugar no ranking mundial da LGFBTfobia. Segundo a CNTE e a
Anajudh LGBTI, a censura imposta ao tema pelo município “não pode
subsistir em uma sociedade minimamente tendente à dignidade, à justiça, à
liberdade e à solidariedade”. “Proibir que a realidade desigual
encarada pela população feminina e LGBT seja abordada em sala de aula é
medida que contraria de forma direta os princípios da prevalência dos
direitos humanos (artigo 4º, inciso II, da Constituição)”, argumentam.
Ainda conforme as entidades, a norma viola os princípios da liberdade de
expressão e de cátedra e o dever estatal de proporcionar acesso à
cultura e à educação e de combater a desigualdade e a marginalização
social (artigo 23, incisos V e X, da Constituição Federal), entre outros
dispositivos constitucionais.
As entidades pedem a concessão de liminar para suspender a eficácia da
emenda à Lei Orgânica municipal e sobrestar os processos em tramitação
no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e nos Tribunais de Justiça do país
envolvendo leis que estabeleçam censura a conteúdos ou termos
relacionados à sexualidade, gênero, orientação sexual e identidade de
gênero até o julgamento definitivo da ADPF 600. No mérito, pedem a
declaração da inconstitucionalidade da norma. O ministro Luís Roberto
Barroso é o relator.
Presidência
O ministro Dias Toffoli, presidente do STF, verificou que o caso não se
enquadra na previsão do artigo 13, inciso VIII, do Regimento Interno do
STF, que prevê a competência da Presidência para decidir questões
urgentes nos períodos de recesso ou de férias. Em razão disso,
encaminhou os autos ao relator, ministro Luís Roberto Barroso, para
posterior apreciação do processo.
EC,CF/AD
*Recomendações sobre a aplicação da legislação internacional de
direitos humanos em relação à orientação sexual e identidade de gênero
aprovadas em 2006 em Yogyakarta, na Indonésia, pela Comissão
Internacional de Juristas e o Serviço Internacional de Direitos Humanos.
Processo relacionado: ADPF 600
Link: http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=416732&tip=UN